DANI PORTELA: “PARTICIPAÇÃO DO POVO NEGRO NA POLÍTICA VAI À ALÉM DA REPRESENTATIVIDADE”

Foto: Tom Cabral / Divulgação

No dia em que se completa 133 anos da abolição da escravatura no Brasil – que diga-se, não chegou a reparar o que nos fora tirado por um sistema majoritariamente branco – é importante destacar o espaço político que vem sendo ocupado por pessoas negras, a exemplo da vereadora Dani Portela (PSol) e do vereador Vinícius Castello (PT).  Nomes que encabeçam uma luta que busca trazer à prática uma liberdade que parece existir apenas no papel. 

A um ano de mais uma eleição, os impactos do último pleito ainda reverberam no cenário nacional. A representatividade negra avançou algumas casas, fator impulsionado pela decisão do STF, ano passado, que referendou liminar sobre incentivos a candidatos/as negros/as nas eleições. Em Pernambuco, de acordo com dados levantados pela reportagem no site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o aumento tímido de 3,2% no número de candidaturas negras eleitas em 2020 apontam essa mudança. 

“A participação do povo negro na política vai para além da representatividade. É o ato de aquilombar – tomar posse daquilo que é seu por direito”. É o que destaca a vereadora afro mais votada do Recife, em 2020, Dani Portela (PSOL). Une-se a ela, o vereador olindense Vinicius Castello (PT), que acredita ainda haver muito o que ser feito. “As políticas públicas, embora existam, ainda não são 100% eficazes. São feitas para pretos por brancos. Precisamos que os pretos ocupem esse lugar e produzam as próprias políticas”, assinala o petista.

Posicionamento que dialoga com o da cientista política Flávia Bozza. “Uma vez que essas pessoas vão avançando no cenário político, elas vão contribuindo com a inserção de uma população que muitas vezes esteve fora da pauta, fazendo com que a população negra tenha sua realidade representada de uma forma mais próxima”, avalia. 

Questionado sobre a representação afro, em um cenário caótico, Vinícius ressalta que ele, assim como outros pretos eleitos, “são jovens que passam a ser ouvidos e ter voz”. “Mesmo que não queiram escutar, a nossa eleição é a chegada de uma nova maneira de se fazer política, se comunicar, agir, pautar. Acredito que faz com que haja vários questionamentos no porquê de tantas reivindicações através de um mandato que não só vem para a população de um modo geral, mas acaba representando-os”, destaca.

O crescimento de candidaturas e eleições de pessoas pretas, segundo Vinícius, representa uma mudança tímida, que ainda tem muito caminho a percorrer. “Tanto a minha eleição aqui em  Olinda quanto muitas que estão se levantando em outros municípios, principalmente nesta última eleição, é o início de uma mudança nos quadros políticos. Significa dizer que é suficiente? Jamais. Ainda temos que caminhar imensamente”, pontuou o petista. 

Vereador de Olinda Vinícius Castello

 Sobre o dia 13 de maio, celebrado hoje, que nos leva ao sentido de luta, Dani Portela (PSol) ressalta que não é uma data a ser comemorada. Sobre isso, ela argumenta que “nós não devemos comemorar o 13 de maio. Apesar de ter sido assinada pela princesa Isabel em 1988, a gente não tem o que comemorar. A gente precisa olhar o tratamento que foi dispensado à população preta no Brasil. A escravidão acabou, mas a maior parte dessa população não foi integrada. Que a nossa luta no parlamento, nas universidades, seja chamada de aquilombar”.

LONGO CAMINHO À PERCORRER


Em 2016, 1.328 candidaturas negras foram eleitas em Pernambuco. Já em 2020, o acréscimo de 3,2% nesse quantitativo representou 1404 pessoas, entre mulheres e homens negros/as, que saíram vitoriosas naquele ano. Os resultados dos últimos pleitos podem pavimentar caminhos para as próximas eleições de 2022, como avalia Flávia Bozza.

“Me parece que a gente tem lideranças jovens muito engajadas acreditando na política como caminho de transformação, existe um incentivo maior para se trabalhar com essas pautas Acredito que podemos esperar um aumento de representação negra nas próximas eleições…”, frisou. É importante que esse aumento também se materialize nas candidaturas de mulheres negras, grupo mais sub-representado no cenário político.

De acordo com dados do Mulheres Negras Decidem (MND), em 2016, elas eram apenas 3,2% das prefeitas e 5% das vereadoras eleitas nos municípios brasileiros. No ano passado, elas conseguiram conquistar 3,9% dos poderes executivos municipais e 6,3% das Câmaras de Vereadores espalhadas pelo Brasil. Ao destacar que mulheres negras carregam o poder de libertação, a filósofa Lélia Gonzalez defendia o lema “organização já”, como via de enfrentamento às mazelas sociais que empurram essas mulheres para a base da pirâmide social.

A visão é compartilhada e trabalhada pela vereadora Dani Portela (Psol), que tem como uma de suas principais propostas, a criação de uma Comissão Permanente de combate ao racismo na Câmara de Vereadores – projeto que segue em análise na Casa de José Mariano – além da criação do Estatuto de Igualdade Racial da Cidade do Recife.

 “A gente precisa entender que o enfrentamento ao racismo não é uma área que pode ficar em secretarias e pastas, criar comissões permanentes é uma saída”. A gente tem que olhar pela perspectiva de combate e propagar  políticas públicas”, comentou Portela (PSol). Posicionamento que dialoga com o da cientista política Flávia, “é por meio da política que se pode inserir essa população em condições de igualdade, em garantia de direitos básicos, inclusive o direito à vida”. 

Relembrando o seu primeiro discurso realizado na cerimônia de posse dos vereadores na Câmara Municipal do Recife, no início do ano, Dani Portela destaca: “Eu chamei aquele discurso não de posse, mas de reintegração de posse. Isso, pra mim, tem uma força muito grande”, conta.  “Eu me vejo como uma Dani que representa. O racismo estrutural ainda define lugares que devemos ou não chegar. Disputar esses espaços é fundamental”, arremata.

MOBILIZAÇÃO


Nesta quinta-feira (13), uma vigília, organizada pela Articulação Negra de Pernambuco, será realizada a partir das 17h, na Praça do Derby, área central do Recife. O movimento é realizado em memória das milhares de vítimas do genocídio negro. A atividade conta com a distribuição de máscaras e álcool gel, e orienta a manter o distanciamento e que pessoas que têm quaisquer sintomas gripais fiquem em casa e acompanhem ao vivo a vigília através das redes sociais.

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