O professor Marcos Guedes, do departamento de Ciência Política da UFPE, escreveu há alguns anos um livro baseado na sua tese na Universidade de Essex, Reino Unido, com o título “Comunismo e Stalinismo no Brasil”, como registro do centenário da Revolução Russa de 1917.
Na publicação, da editora Prismas, ele apresentou uma interpretação geral das políticas do Partido Comunista Brasileiro (PCB) a partir de uma abordagem internacional, cobrindo diferentes períodos da vida do Partidão, desde o fim da década de 1920 até sua dissolução em 1992.
Era completa a subordinação dos comunistas brasileiros aos chefões de Moscou. O Comintern mandou e desmandou no PCB. Luiz Carlos Prestes se dizia independente, mas ele e seus camaradas submetiam-se a ordens absurdas ou não e abocanhavam o “ouro de Moscou” para fazer a revolução que nunca houve, registrou Guedes em seu livro.
O fim da União Soviética no início dos anos 1990 significou também o fim da exportação da ideologia e o corte dos financiamentos, legais e clandestinos, e subsídios puramente ideológicos para incomodar o inimigo na Guerra Fria, como aconteceu com Cuba, que, além de entreposto soviético diante dos EUA, era também um centro de treinamento de guerrilha para a América Latina.
Os pós-aliados soviéticos engordaram e não conversam mais sobre revolução. A não ser sobre o que possam fazer para crescer suas contas bancárias. A conversa mudou. Os russos agora fazem negócios. Privatizaram estatais e criaram uma economia forte capitalista. A única lembrança do comunismo é o autoritarismo governamental.
Os russos negociam de olho nos ganhos financeiros ao apoiar a Venezuela e Argentina, numa política de “cerca lourenço” aos interesses econômicos dos Estados Unidos, no terreiro que os americanos consideram seu quintal.
Por isso, a viagem do presidente Bolsonaro à Rússia chateou tanta gente: os americanos do Partido Democrata e a esquerda brasileira ligada aos interesses chineses que hoje pagam suas contas. Uma diplomacia pendular tira parceiros da zona de conforto.
Diferente dos russos, que têm hoje um partido comunista minúsculo e desimportante, a ditadura chinesa de Xi Jinping mantém uma gigantesca máquina partidária, chamada erradamente de Partido Comunista Chinês (PCC), apenas como uma tintura ideológica da sua atual postura capitalista.
Um capitalismo controlado pelo Estado que alavancou o país do período da fome comunista para o consumismo do século 21.
Os chineses mudaram sua relação com o mundo. Já não estimulam revoluções terceiro-mundistas como a das décadas de 1960. Países e pessoas para os ex-maoístas são hoje apenas mercadorias à venda. Para fazer as compras usam o superávit de suas finanças, obtido a partir dos anos 1990 pela quase escravização do seu povo para trabalho nos grandes empreendimentos internacionais.
Os chineses vêm espalhando parte de sua população pelo mundo, um pé na África, outro na América Latina, num patamar economicamente superior às primeiras migrações dos séculos 19 e 20. Hoje, eles são investidores que querem retorno do investimento a qualquer custo.
Constroem portos e ferrovias na África para transporte de mercadorias e posicionamentos militares. Não querem nem ser o Xerife de uma nova era, como os Estados Unidos foi no passado. Querem ser os donos do mundo: o yuan, a moeda e o mandarim, o idioma.
Portanto, nada mais anacrônico do que se apresentar como comunista, o que não mais existe. Os vermelhos de outrora são verdes por conta das mudanças climáticas ou implacáveis fiscais da ditadura do politicamente correto. O autoritarismo se mantém.
E como cantava Cazuza: “Meu partido/É um coração partido/E as ilusões/Estão todas perdidas. Os meus sonhos/Foram todos vendidos/Tão barato que eu nem acredito/Ah eu nem acredito (…) Meus heróis/Morreram de overdose/Meus inimigos/Estão no poder”.
“Ideologia/Eu quero uma pra viver/Ideologia/Eu quero uma pra viver”. A ideologia agora é a grana. É isso.
Por: Antonio Magalhães – Jornalista