ELEIÇÕES 2024: PODE CHAMAR O ADVERSÁRIO DE “NAZISTA” OU FACISTA?

Supremo Tribunal Federal (STF) entrou em um debate crucial sobre os limites da liberdade de expressão no contexto político que deve estar presente nas eleições desse ano. Afinal, é permitido rotular adversários como “nazistas” ou “fascistas”? Até que ponto os parlamentares podem usar termos controversos sem violar a honra individual com base na imunidade parlamentar?

Na última terça-feira, os ministros do STF mergulharam nesse embate durante a análise de uma queixa-crime apresentada pelo deputado federal Gustavo Gayer (PL-GO) contra o também deputado José Nelto (PP-GO). Nelto, em uma entrevista a um podcast no ano anterior, não poupou adjetivos ao se referir ao seu colega de Câmara, chamando-o de “nazista”, “fascista” e “idiota”, além de acusá-lo de agredir uma enfermeira.

O ponto central da discussão gira em torno da interpretação desses termos. O ministro Flávio Dino foi um dos primeiros a manifestar sua posição, argumentando que chamar alguém de “nazista” ou “fascista” faz parte do debate político e não deve ser considerado uma ofensa pessoal passível de punição legal. Ele destacou que esses termos são parte de uma corrente política reconhecida internacionalmente e não devem ser interpretados como ataques diretos à honra individual.

Entretanto, a relatora do caso, ministra Cármen Lúcia, adotou uma visão diferente. Ela votou para receber a queixa pelos crimes de calúnia e injúria, enfatizando que as acusações feitas por Nelto são sérias o suficiente para justificar uma investigação mais aprofundada.

Para Cármen, termos como “nazista” têm uma carga histórica significativa, evocando os horrores da Segunda Guerra Mundial e representando não apenas uma questão de opinião política, mas sim uma imputação grave.

A divergência de opiniões entre os ministros reflete a complexidade do assunto em questão. Por um lado, há a preocupação em preservar a liberdade de expressão e o direito ao debate político vigoroso, sem o risco de censura ou punição indevida. Por outro lado, há a necessidade de proteger a dignidade e a honra dos indivíduos contra acusações infundadas e difamatórias.

O ministro Flávio Dino afirmou que rotular alguém de “nazista”, “fascista” ou outras classificações políticas não deve ser equiparado a acusações de crimes específicos, como agressão ou homicídio. Ele argumenta que esses termos fazem parte do vocabulário político há décadas e são usados para descrever ideologias e posicionamentos políticos, não para denegrir a reputação pessoal de alguém.

No entanto, para a ministra Cármen Lúcia e outros ministros que compartilham de sua visão, o contexto histórico e emocionalmente carregado desses termos os torna mais do que simples rótulos políticos. Eles representam ideologias que foram responsáveis por atrocidades inimagináveis durante a Segunda Guerra Mundial e, como tal, não devem ser usados levianamente ou como ferramentas de difamação.

Sabemos que a legislação brasileira aborda os crimes contra a honra no Código Penal, nos artigos 138 a 145. Esses crimes são divididos em três categorias principais: calúnia, difamação e injúria. E, para a configuração desses crimes, é necessário que haja dolo, ou seja, a intenção de ofender a honra alheia. Entretanto, a legislação prevê algumas exceções como a imunidade parlamentar.

A importância desse debate é que a decisão do STF pode ter repercussões significativas não apenas no âmbito jurídico, mas também no cenário político nacional e nas eleições de outubro. Uma eventual permissão para o uso indiscriminado de termos como “nazista” ou “fascista” em debates políticos poderia acirrar ainda mais os ânimos e polarizar o ambiente político, tornando o diálogo e o consenso ainda mais difíceis de alcançar”.

Diante desse impasse, o ministro Alexandre de Moraes pediu vista do processo, suspendendo temporariamente o julgamento e fornecendo mais tempo para uma análise cuidadosa dos fatos e argumentos apresentados. No entanto, fica claro que essa questão não será resolvida facilmente e continuará a gerar debates acalorados tanto nos tribunais quanto na esfera pública.

Enquanto isso, o País observa atentamente e aguarda a decisão final do STF sobre esse assunto delicado. A entendimento do Supremo tem o potencial de moldar não apenas o futuro do debate político, mas também os limites da liberdade de expressão e da responsabilidade individual em uma sociedade democrática. Qual será o nível do debate nas eleições de 2024?

Por: João Valença – Advogado (especialista em Direito Eleitoral).

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